SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar está em disparada nesta segunda-feira (3), com investidores repercutindo a imposição de tarifas do governo Donald Trump, nos Estados Unidos, a produtos importados do Canadá, México e China.
Às 11h46, a moeda norte-americana subia 1,14% e estava cotada a R$ 5,902, máxima da sessão até aqui. Já a Bolsa caía 0,17%, aos 125.919 pontos.
No sábado (1º), o presidente dos Estados Unidos cumpriu a promessa de impor tarifas sobre importações do Canadá, México e China, em uma ação que pode destravar uma nova era de guerras comerciais entre a maior economia do mundo e três de seus principais parceiros comerciais.
Trump assinou um decreto aplicando tarifas adicionais de 25% a todas as importações do Canadá e México, com exceção de produtos de petróleo e da energia canadenses, que enfrentarão uma taxa de 10%.
O Canadá é de longe o maior fornecedor de petróleo dos EUA, respondendo por cerca de 60% das importações americanas de petróleo bruto. Um oficial da Casa Branca disse que tarifas mais baixas para energia canadense visam minimizar os “efeitos disruptivos” nos custos da gasolina e do aquecimento doméstico nos EUA, mas confirmou que não haveria mais exclusões.
Já os produtos chineses enfrentarão uma tarifa de 10%, além das tarifas já existentes dos EUA.
Segundo a Casa Branca, as novas tarifas entrarão em vigor a partir de terça-feira (4). O governo afirmou que cada decreto contém uma cláusula anti-retaliação, de modo que, se algum país decidir revidar, medidas adicionais serão implementadas, provavelmente como aumento das tarifas.
No entanto, os países afetados já estão se movimentando. No próprio sábado, o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, anunciou a imposição de tarifas de 25% sobre 155 bilhões de dólar canadenses (US$ 106 bilhões) em produtos americanos. Os impostos sobre 30 bilhões entrarão em vigor na terça. O restante será efetivado em 21 dias.
Os impostos recairão sobre produtos como cerveja, vinho, uísque, frutas, sucos, roupas, equipamentos esportivos e eletrodomésticos. Trudeau também pediu aos canadenses que evitem comprar produtos americanos, dando preferência aos de produção local.
Ainda sem anunciar represálias como as do Canadá, a China informou que desafiará as tarifas por meio da OMC (Organização Mundial do Comércio).
“A imposição de tarifas pelos EUA viola seriamente as regras da OMC”, afirmou o Ministério do Comércio chinês em um comunicado, instando os EUA a “engajarem-se em um diálogo franco e fortalecerem a cooperação.”
Já a presidente do México, Claudia Sheinbaum, usou o X (antigo Twitter) para dizer que instruiu seu ministério da economia a também criar tarifas retaliatórias, mas sem dar maiores detalhes.
“Rejeitamos categoricamente a calúnia feita pela Casa Branca ao Governo do México de ter alianças com organizações criminosas”, escreveu a governante de esquerda na rede social X.
Embora tenha encontro marcado para esta segunda com os líderes do Canadá e do México, Trump minimizou a possibilidade de eles serem capazes de mudar seu pensamento.
A justificativa para a execução das tarifas havia sido a da imigração. Segundo o republicano, Canadá e México haviam afrouxado a segurança nas fronteiras e, ao lado da China, não fizeram o suficiente para conter o fluxo de opioides nos EUA. Ele ainda sinalizou que tarifas sobre a União Europeia podem ser anunciadas em breve.
Para especialistas, as medidas de Trump colocaram em curso uma “guerra comercial com esteroides”.
“Essas tarifas anunciam uma nova era de protecionismo comercial dos EUA que afetará todos os parceiros comerciais americanos, sejam rivais ou aliados, e interromperá significativamente o comércio internacional”, diz Eswar Prasad, professor da Universidade Cornell.
A imposição de tributos mais altos pode afetar fluxos comerciais, aumentar custos e provocar retaliações. Na economia doméstica dos EUA, ainda há o risco de um repique inflacionário, o que pode comprometer a briga do Fed (Federal Reserve, o banco central norte-americano) contra a inflação e forçar a manutenção da taxa de juros em patamares elevados o que fortalece o dólar.
Neil Shearing, economista-chefe na Capital Economics, calcula que as tarifas podem empurrar a inflação para acima de 3%, em comparação com os 2,6% atuais. Impostos pesados sobre a UE e a China empurrariam o crescimento dos preços nos EUA ainda mais, alertou.
Na reunião do Fed da semana passada, o presidente Jerome Powell disse que é muito cedo para dizer quais serão os impactos das políticas de Trump e que levará o tempo necessário para avaliar seu significado. “Não sabemos o que acontecerá com as tarifas, com a imigração, com a política fiscal e com a política regulatória.”
Para o economista André Perfeito, a guerra comercial de Trump “visa aumentar a arrecadação de tributos para tentar sanear o déficit gigante dos EUA”.
“O uso de tarifas só faz sentido se usado de maneira cirúrgica, em setores específicos e com bastante bastante dinamismo. Elas encarecem os produtos importados, o que, em tese, favorece a produção local, mas a escolha lógica dos empresários locais é subir o preço para o novo preço de equilíbrio mais alto, tentando capturar esses excedente”, diz ele.
“Contudo, há aí uma grande oportunidade: o Brasil pode comer pelas beiradas e fornecer para Canadá, México e China mais mercadorias. Como se diz, crise é oportunidade e, nesse caso, é a oportunidade da década.”
Ainda assim, a expectativa de curto prazo é de pressão inflacionária e de valorização global do dólar precificada já na abertura dos negócios desta semana.
Na Europa, o índice Stoxx 600 e a Bolsa de Londres (FTSE 100) recuaram 1,4% pela manhã, refletindo a incerteza do mercado. Nos EUA, os contratos futuros do S&P 500 caíram 1,6%, enquanto os do Nasdaq, focado em tecnologia, recuaram 1,9%.
No mercado de câmbio, o dólar subiu 1% em relação a uma cesta de moedas fortes. O peso mexicano caiu quase 3%, e o dólar canadense atingiu seu menor nível desde 2003.