SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após duas sessões consecutivas de queda, o dólar encerrou o pregão desta segunda-feira (23) com disparada de 1,86%, a R$ 6,184. A situação reflete a frustração dos agentes financeiros com as contas públicas após a aprovação do pacote de corte de gastos no Congresso Nacional, segundo analistas.
Esse é o segundo maior valor nominal já registrado da moeda norte-americana, ficando atrás apenas do recorde alcançado em 18 de dezembro, quando fechou o dia a R$ 6,267.
Já a Bolsa encerrou em queda de 1,09%, aos 120.766 pontos. Já as taxas de juros futuros subiram mais de 40 pontos percentuais.
Investidores também repercutiram a divulgação do Boletim Focus, que mostrou que as expectativas de inflação estão cada vez mais desancoradas.
O mercado seguiu a tendência de avanço da moeda norte-americana no exterior, em um dia marcado pela baixa liquidez antes do Natal e pela ausência do BC (Banco Central) nos negócios.
Internamente, as preocupações dos investidores seguem voltadas para a área fiscal do governo, ainda que na sexta-feira o Senado tenha concluído a votação do pacote de medidas para segurar os gastos públicos. Com o Congresso em recesso até fevereiro, Brasília também vai diminuindo o ritmo neste fim de ano.
“Como o BC não fez leilão, isso pressionou a taxa. E a liquidez está baixa, porque estamos perto do fim do ano”, comentou durante a tarde o diretor da Correparti Corretora, Jefferson Rugik.
A equipe da XP estimou que, após tramitação do pacote no Congresso, o potencial de economia fiscal no próximo biênio recuou de R$ 52 bilhões para R$ 44 bilhões. Os cálculos do governo apontavam para cerca de R$ 70 bilhões.
“Apesar da direção correta, vemos esse ganho como insuficiente para garantir o atingimento das metas de resultado primário e, principalmente, a manutenção do limite de despesas do arcabouço fiscal nos próximos anos”, afirmaram em relatório publicado mais cedo nesta segunda-feira.
“A frustração em torno do anúncio do pacote de controle de gastos contribuiu sobremaneira para a elevação da incerteza”, afirmou a equipe do Departamento de Pesquisa Econômica do Banco Daycoval, chefiado pelo economista Rafael Cardoso, em relatório com revisão de estimativas macroeconômicas.
“Mantivemos entendimento de que dada a dificuldade em encaminhar medidas impopulares, mas necessárias ao ajuste fiscal, a trajetória de resultado primário e dívida pública devem continuar em trajetória desafiadora.”
No radar dos investidores também esteve o Boletim Focus, divulgado nesta segunda. Analistas consultados pelo Banco Central elevaram pela sexta semana seguida a projeção para a taxa básica de juros no final de 2025 e passaram a ver a Selic a 14,75%.
A projeção do mercado para a alta do IPCA em 2024 passou de 4,89% para 4,91% e em 2025 foi de 4,60% para 4,84% em ambos os casos bem acima da meta contínua de inflação perseguida pelo BC, de 3%.
O centro da meta oficial para a inflação é de 3%, sempre com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou menos.
O cenário para o câmbio também revela pressão, com projeção de dólar a R$ 6,00 no fim deste ano e a R$ 5,90 no encerramento do próximo.
No exterior, investidores ainda digerem a mais recente série de reuniões de bancos centrais. Na semana passada o Federal Reserve surpreendeu os mercados ao projetar um ritmo moderado de cortes na taxa de juros, fazendo com que os rendimentos dos Treasuries e o dólar subissem. Esta perspectiva seguiu permeando os negócios nesta segunda-feira, com o dólar e os rendimentos em alta.
A sessão do dia também era impactada pelos dados de confiança do consumidor americano, que enfraqueceu em dezembro, à medida que a euforia pós-eleição presidencial diminuiu e surgiram preocupações sobre as condições futuras dos negócios.
O Conference Board informou nesta segunda-feira que seu índice de confiança do consumidor caiu para 104,7 neste mês, de 112,8 revisados para cima em novembro. Economistas pesquisados pela Reuters previam que o índice subiria para 113,3, a partir dos 111,7 relatados anteriormente.
“As visões dos consumidores sobre as condições atuais do mercado de trabalho continuaram a melhorar, consistentes com os dados recentes de empregos e desemprego, mas sua avaliação das condições de negócios enfraqueceu”, disse Dana Peterson, economista-chefe do Conference Board.
Após dois dias de queda firme, as taxas dos contratos de DI (Depósitos Interfinanceiros) fecharam a segunda-feira em forte alta, acima de 40 pontos-base em alguns vencimentos, em meio à desconfiança persistente do mercado com a política fiscal do governo Lula e ao avanço dos rendimentos dos Treasuries no exterior.
Como o mercado no Brasil estará fechado na terça e na quarta-feira em função do Natal, a liquidez também foi afetada nesta segunda, marcada ainda pelo avanço do dólar nesta segunda.
No fim da tarde a taxa do DI para janeiro de 2026 estava em 15,215%, ante 14,903% do ajuste anterior. Já a taxa do contrato para janeiro de 2027 marcava 15,44%, em alta de 45 pontos-base ante o ajuste de 14,992%.
Entre os contratos mais longos, a taxa para janeiro de 2031 estava em 14,63%, ante 14,244% do ajuste anterior, e o contrato para janeiro de 2033 tinha taxa de 14,38%, em alta de 37 pontos-base ante 14,013%.
“(Há uma) abertura generalizada da curva de juros, (porque) ainda paira muito no mercado a preocupação em relação ao cenário fiscal”, avaliou Henrique Cavalcante, analista da Empiricus, acrescentando que o cenário externo também ajudava a sustentar o avanço dos prêmios no Brasil.
Os preços do petróleo caíram com preocupações diante de excedente e força do dólar. Um dólar mais forte torna o petróleo mais caro para os detentores de outras moedas.
Os preços futuros do petróleo Brent caíram 0,43%, a US$ 72,63 por barril. Os contratos futuros do petróleo West Texas Intermediate dos Estados Unidos caíram 0,32%, a US$ 69,24 por barril.
Na sexta-feira, o dólar fechou em forte queda de 0,87%, a R$ 6,071, após uma sessão de alta volatilidade. Já a Bolsa encerrou o pregão com alta de 0,75%, aos 122.102 pontos.
Os investidores repercutiram os três leilões extraordinários realizados pelo BC (Banco Central), a conclusão da votação do pacote de corte de gastos no Congresso e a fala do presidente Lula sobre a autonomia do BC.
A moeda norte-americana iniciou a sessão desta sexta em queda, cotada a R$ 6,085, e intensificou o movimento após um primeiro leilão à vista de US$ 3 bilhões realizado pelo BC. Com a intervenção, o dólar chegou a despencar 1,18%, negociado a R$ 6,051.
Na primeira intervenção do câmbio, foram aceitas oito propostas acolhidas entre 9h15 e 9h20.
Após um segundo leilão de linha de US$ 2 bilhões, a moeda reduziu as perdas e voltou ao mesmo patamar de antes da primeira intervenção do dia, a R$ 6,082. Nesta segunda atuação, a autoridade monetária aceitou cinco propostas, acolhidas entre 10h20 e 10h25.
Entre 12h30 e 12h35, o BC realizou um terceiro leilão, no qual vendeu mais US$ 2 bilhões. Foram aceitas duas propostas.
O dólar passou a intensificar forte queda após a conclusão da votação do pacote de contenção de gastos proposto pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) e a fala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), dizendo que jamais vai interferir no trabalho de Gabriel Galípolo, futuro presidente do BC.
Ao longo da semana passada, o BC intensificou sua atuação no mercado cambial com a injeção de dólares. Na última segunda-feira (16), a autoridade realizou um leilão à vista de US$ 1,6275 bilhão e outro de linha no valor de US$ 3 bilhões. O dólar fechou cotado a R$ 6,091, batendo um novo recorde histórico nominal.
No dia seguinte, apesar de novas intervenções (US$ 1,272 bilhão à vista e US$ 2,015 bilhões em leilões de linha), o dólar subiu levemente e fechou a R$ 6,095, renovando o recorde.
Na quarta-feira (18), sem leilões, a moeda disparou para R$ 6,267, o maior valor da história.
Na última quinta-feira (19), a moeda norte-americana despencou 2,28% e fechou cotada a R$ 6,124, sob efeito dos dois leilões realizados pelo BC pela manhã.
Desde o último dia 12, foram injetados US$ 27,77 bilhões pela autoridade monetária no mercado de câmbio maior valor já registrado em um mês.
Os leilões são intervenções do BC no câmbio. Na prática, eles servem para aumentar a quantidade de dólares disponíveis para os investidores, seguindo a lei da oferta e demanda. Ou seja, quanto mais moeda puder ser comprada, menor vai ser a cotação dela.
As intervenções têm contido a disparada do dólar nos últimos dias, oriunda da crescente desconfiança do mercado quanto à capacidade do governo de equilibrar as contas públicas. Só em dezembro, a moeda norte-americana acumula alta de 4,45% em relação ao real. No ano, registra valorização de 29%.