PEQUIM, CHINA (FOLHAPRESS) – Após duas decisões seguidas de Pequim que ameaçam afetar as exportações agrícolas brasileiras, o assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, conversou na quarta (22) com o ministro do exterior da China, Wang Yi -que também dirige a comissão de assuntos internacionais do Partido Comunista.
Segundo relato divulgado pelo ministério chinês, tanto Amorim como Wang destacaram que a visita do líder Xi Jinping a Lula há dois meses foi “bem-sucedida” e alcançou “importante consenso”, que agora demanda “implementação”. “Não fizemos propriamente um balanço, mas uma avaliação, dos dois lados, como positiva”, acrescentou Amorim ao jornal.
Na visita de Estado, em novembro, o presidente brasileiro rejeitou a entrada do país na Iniciativa Cinturão e Rota, projeto chinês para infraestrutura no exterior. Antes da cúpula, Lula havia afirmado que entraria, dependendo do que Pequim oferecesse.
“Não houve rejeição, mas harmonização de projetos e programas”, contrapõe Amorim. “Fizemos uma adaptação criativa ao acordarmos que haverá uma sinergia entre programas brasileiros, como o PAC, e a iniciativa chinesa.”
No final de dezembro, a China anunciou investigação sobre suas importações de carne, que têm o Brasil como maior fornecedor. A decisão foi avaliada por um pecuarista paulista como aviso de Pequim, após o Brasil sobretaxar produtos chineses como aço e carros elétricos.
E na própria quarta-feira (22) o Ministério da Agricultura do Brasil informou que a Administração Geral das Alfândegas da China passou a recusar soja brasileira enviada por cinco empresas, entre elas as gigantes americanas Cargill e ADM, após encontrar contaminação química e outras.
Amorim diz que, durante o telefonema de cerca de uma hora, ele e Wang abordaram “questões mais amplas de comércio”, mas não os casos da soja e da carne, especificamente.
Questionado se a conversa tratou das ameaças do novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tanto à China quanto ao Brasil, comentou apenas que “não estamos preocupados com as declarações”, sem detalhar o que foi falado sobre os EUA.
Segundo o relato chinês, Wang afirmou apoio ao Brasil na presidência do Brics. Amorim acrescentou ter falado com Wang da “importância da participação de alto nível” na cúpula do grupo, programada para o meio do ano, no Brasil. “Eles têm lá umas dificuldades de agenda, a gente está trabalhando nisso”, disse.
Ambos conversaram também sobre o Fórum China-Celac (Comunidade de Estados Latino-americanos e do Caribe), grupo que tem encontro previsto para o meio do ano em Pequim. “Lula está convidado”, diz Amorim. “Mas o presidente fazer duas viagens à Ásia é muita coisa. Vamos ver, é uma decisão do presidente. Não é simples.”
Ele confirmou que já está planejada uma viagem de Lula ao Japão e ao Vietnã, em março.
Tanto Amorim como Wang mencionaram ainda a proposta sino-brasileira para a Guerra da Ucrânia, feita no ano passado e que resultou na formação do grupo Amigos da Paz, reunindo também outros países. O brasileiro disse, segundo o relato oficial, que “ambos os lados devem aproveitar a oportunidade para alavancar ainda mais o papel da plataforma”.
Depois ele argumentou ao jornal que “esse projeto sino-brasileiro é cada vez mais oportuno, para evitar radicalismo de posições”.
Wang Yi, que visitou o Brasil em janeiro do ano passado, fechando a tradicional viagem dos chanceleres chineses à África no início de cada ano, desta vez se limitou ao telefonema. Mas Amorim adianta que o diálogo é constante e que deverá encontrá-lo na Conferência de Segurança de Munique, em meados do mês que vem, quando “a gente vai retomar esses temas”.