Tomar um remédio por conta própria para aliviar uma dor de cabeça pode parecer inofensivo, mas esse hábito resultou em 1.947 casos de intoxicação no Espírito Santo entre 2022 e 2024.
Os dados são do Centro de Informação e Assistência Toxicológica (Ciatox), vinculado à Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), e incluem apenas os casos relacionados à automedicação e ao uso incorreto de medicamentos. Em 2022, foram registrados 483 casos. No ano seguinte, esse número quase dobrou, chegando a 884. Já em 2024, até o momento, foram contabilizados 580 casos.
No Brasil, a automedicação é uma prática frequente. Segundo uma pesquisa do Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade (ICTQ), 89% da população recorre a medicamentos sem prescrição médica. No entanto, essa prática pode agravar problemas de saúde e, em alguns casos, levar à necessidade de internação.
O Ministério da Saúde destacou que o uso indevido de medicamentos tem causado um aumento significativo nas hospitalizações em alguns estados, incluindo o Espírito Santo, onde o número de internações subiu de 24 em 2023 para 1.479 em 2024.
Em nível nacional, 3.148 pessoas foram internadas em 2023 devido a complicações causadas pelo uso inadequado de medicamentos. Em 2024, esse número subiu para 6.128, totalizando 9.276 internações no período.
Consequências da automedicação
A hepatologista e gastroenterologista Mariana Pacheco alerta para os riscos da automedicação, que pode trazer consequências graves.
“Tomar um remédio sem orientação médica pode resultar no uso de uma substância ineficaz para aquela condição e, em alguns casos, piorar o quadro. Por exemplo, uma pessoa com dor no peito pode tomar um analgésico achando que é algo simples, quando, na verdade, pode estar sofrendo um infarto, que exige atendimento médico imediato”, explica a médica.
Já o farmacêutico Silvio Louzada, membro do Grupo Técnico de Farmácia do Conselho Regional de Farmácia do Espírito Santo (CRF-ES), destaca que o uso de qualquer substância terapêutica, seja de origem química, vegetal ou outra, deve ser supervisionado por um médico ou farmacêutico.
“Esses profissionais possuem conhecimento técnico para indicar corretamente os medicamentos, avaliar possíveis efeitos colaterais e identificar restrições de uso”, afirma Louzada.
Mistura de medicamentos pode ser perigosa
Todos os medicamentos possuem efeitos colaterais, e a combinação inadequada entre eles pode aumentar os riscos para a saúde. Para aqueles que fazem uso contínuo de algum remédio, ingerir outros fármacos sem recomendação médica pode ser ainda mais perigoso, pois as interações medicamentosas podem comprometer o tratamento.
A hepatologista Mariana Pacheco explica que a interação entre substâncias pode alterar a eficácia dos remédios, tornando-os mais ou menos potentes do que o esperado.
“Pacientes que utilizam anticoagulantes, por exemplo, podem ter seu efeito reduzido ao combinar com certos medicamentos, aumentando o risco de trombose. Além disso, há casos em que as interações potencializam os efeitos colaterais”, alerta a médica.
Outra combinação perigosa, segundo o farmacêutico Silvio Louzada, é o uso simultâneo de anti-inflamatórios com ácido acetilsalicílico (aspirina), pois ambos têm ação desagregadora plaquetária e podem aumentar o risco de sangramentos, além de favorecer o desenvolvimento de úlceras gástricas.
“É fundamental lembrar que ‘a diferença entre um medicamento e um veneno está na dosagem’. Toda substância química tem um impacto no organismo e deve ser utilizada com cautela”, ressalta Louzada.